Monday, September 29, 2008

Curiosidades II

O Buzinês

Agora estou dirigindo na Índia. Sim, comprei uma scooter e estou me aventurando no transito. Faço parte da massa que entope os becos, ruas, avenidas e “trilhas de rally” (porque pra ter mais buraco, terra e barro só no Paris-Dakar) que cortam Bangalore, e começo a entender um novo idioma: a buzina. É como se os carros estivessem conversando: uma ultrapassagem tem 3 buzinas: “Abre espaço. To passando. Já vi, pode ir.” Num cruzamento sempre tem discussão e quando não tem entendimento ficam todos parados, um de frente para o outro sem ter como sair.

 

Caminhões

Os caminhões são um show a parte nas estradas. Sempre ultra-coloridos, pintados, com adesivos e cheios de coisas penduradas: chumaço de cabelo, flores secas, flores frescas, brinquedos, panos coloridos, estatuetas de deuses, foto da família, etc. Na traseira, sempre escrito “Horn OK Please” – buzine por favor. (já expliquei isso aqui). Outra característica é que são muito quadradões, alguns literalmente são containers (como aqueles dos portos) com rodas. A grande maioria está caindo aos pedaços e não é difícil vê-los com muito mais carga que deviam. Nunca vi um caminhão-pipa que não estivesse vazando água pela rua afora – agora imagina um caminhão-tanque, carregando combustível?

 

Carro de Família

Continuando no trânsito, outra curiosidade... Na Índia, moto é veículo de família! É muito comum ver um pai carregando os 5 filhos empilhados numa moto, mulheres carregando recém-nascidos na garupa ou criancinhas que não devem nem andar ainda, se segurando no guidom da moto. Detalhe importante, o capacete só é obrigatório para o motorista...

 

Refeições barulhentas

Lembro o quanto meus pais (meu pai principalmente) me educaram a não comer de boca aberta e tentar não fazer ruídos ao mastigar. Aqui na Índia eles teriam um troço. A impressão que dá é que comer de boca aberta, estalando a língua, chupando os dedos e fungando o nariz (por causa da pimenta) é sinal de que está gostando da comida. Tem um cara que trabalha perto de mim e cisma de comer em frente ao computador, ao invés de ir pro refeitório – tenho q colocar fones de ouvido e música alta para concentrar no trabalho.

 

Cinema

Depois de muuuito tempo fui ao cinema. A primeira barreira é conseguir o ingresso. Aquilo de ligar pra um amigo, 1 hora antes, combinar de pegar um cineminha, chegar 20 minutos antes da sessão (que é pra dar tempo de dar uma volta no shopping) e ver o filme é coisa do meu passado. Aqui tem que comprar com antecedência de dias, se for lançamento é melhor nem ir durante o fim de semana. Os cinemas dos shoppings são modernos, muito confortáveis e de ótima qualidade de som e imagem. As bizarrices são: primeiro toca o hino nacional. As pessoas chegam a qualquer momento – mesmo com 40 minutos de filme ainda tem gente chegando. TEM INTERVALO!! Não importa o tamanho do filme, tem um intervalo, sem aviso prévio. Abruptamente o filme é cortado, as luzes se acendem e o pessoal sai pra comprar tudo que é fritura – o pior é que não avisam quando o filme irá recomeçar... Perdi uma parte de Dark Knight porque não sabia que já tinha começado (pô, nem uma campanhiazinha??)

 

Santos Católicos, adoração Hindu

A comunidade católica em Bangalore é bem grande, se comparada às outras cidades que fui. Tem muita igreja, altar pra santinho... O curioso é que apesar dos santos terem os mesmos nomes (só que em Inglês) e a mesma imagem, a maneira de adoração é diferente  - mais voltada pro Hinduísmo. Às vezes colocam comida (que seria o Pooja), sempre colocam aqueles colares de flores (dente-de-leão), marcam a face do santo com aquela maquiagem vermelha, vestem Nossa Senhora de saree, etc. Como diria Gil (leia com sotaque baiano), “é o sincrétismo culto-réligioso em sua expressão típica do súb-continênte asiático.”

 

É briga?

Além das buzinas incessantes, outro barulho constante é das vozes dos indianos. Não bastassem falaram super rápido em 23 diferentes dialetos incompreensíveis, falam com uma tonalidade que parecem estar brigando com um inimigo mortal a todo o momento. No início eu ficava sempre observando, esperando sair um tapa – depois descobria que era só uma discussão sobre algum pequeno detalhe.  Será que volto meio surdo pro Brasil?

 

Construção, Mulheres e Ferramentas sem cabo.

Um engenheiro civil deve ficar muito chocado na Índia. É muito bizarro a maneira que eles constroem as coisas por aqui. Não dá pra explicar muito, mas vou enumerando as bizarrices: os tijolos são, em sua maioria, de pedra (furar uma parede na Índia é tarefa pra broca industrial – pra pendurar quadros tem que se fazer um enxerto de madeira na parede, não tem prego que fure.

Tem muitas mulheres trabalhando. Mas não se preocupem, elas só fazem o trabalho pesado: preparar massa, carregar pedra, carregar água, areia... O trabalho “pensante” só homem que faz. – como explicou um mestre-de-obras a um amigo engenheiro. Elas carregam tudo na cabeça, e feito formigas vão andando em filas dentro da construção.

As ferramentas tem todas cabos muito curtos.
Isso é geral! Vassoura, pá, enxada, rodo, picareta... tudo tem um cabo minúsculo que dificulta muuito o trabalho (na minha opinião). E o trabalho é praticamente artesanal, somente construções muuito grandes têm maquinas trabalhando...

 

Supermercado

Pra ir no supermecado fazer a compra da semana (ou do mês) tem que rezar pra ter sorte antes. Não existe padrão! Aquela marca de macarrão que você comprou semana passada, não tem mais e talvez nunca mais tenha. Eu comi granola por 2 meses, depois nunca mais achei. Tem semana que tem da batata grande, outra só da pequenininha, tem semana que tem feijão, outras não... E tem lugar ainda que você tem que passar por diversos caixas para pagar: 1 só para pagar frutas, outro para as carnes, outro para as bebidas... A conta ainda vem dividida no que é comida e no que é não-comida.

 

Crime

Algumas pessoas me perguntam sobre violência aqui. É muito raro ter assalto nas ruas, ladrão de carteiras, etc. O lado ruim é que tem extremismo religioso, ataque terrorista, mulheres são estupradas, tem vandalismo até por rivalidade de línguas!!! Lembro de um cinema que foi apedrejado só porque estava estreando um filme em Tamil (língua falada no estado vizinho de Karnataka). Imagina se a gente resolve explodir a Globo por causa do carioquês?

 

Caneta

Isso é uma coisa que se encontra em pequenas cidades; triste, mas interessante... Crianças pedindo lápis e caneta. Me disseram que há um tempo, elas ficavam mendigando por comida e dinheiro – mas aí teve uma campanha enorme para que fossem dadas canetas às crianças, para ir à escola. Acabou virando tradição então você vê crianças pedindo caneta, com livrinhos nas mãos ao invés de dinheiro.

 

Hijras e Prostitutas

Há um grupo de transexuais muito respeitado aqui – acredite se quiser. São considerados semi-divinos, têm os genitais amputados quando criança, vestem saree (a veste tradicional da mulher indiana) e saem pelas ruas abençoando os homens em troca de moedas. Quem dá moeda é abençoado (na cabeça lá de baixo) e tem fertilidade, quem não dá pode ser amaldiçoado (também relativo à cabeça de baixo...).

Outra grande surpresa foi descobrir prostitutas vestidas de saree em pleno centro de Bangalore. Estava indo a um jantar com uma amiga e resolvemos sair da avenida mais movimentada e ir a uma avenida paralela para pegarmos um riquixá e evitarmos o transito. Na calçada, mulheres com bijuterias, saree (que cobre o corpo todo) e maquiagem. Na sarjeta, riquixás parados esperando por clientes para pagar a moça e uma corrida especial... Não deu pra pegar riquixá nessa avenida.

 

Contando Dedos

Os gestos dos indianos são todos muito diferentes a começar pelo jeito que dizem “sim” com a cabeça (que eu agora faço naturalmente). Um muito curioso talvez seja como contar com os dedos. Eles contam com as falanges, então cada dedo vai até 3 e em cada mão dá pra contar até 12 – pois o polegar é utilizado somente para apontar o valor. Talvez esteja aí a origem da “dúzia”.

 

Cachorrada

Além de vacas, ratos e esquilos, as ruas têm muitos cachorros – muitos! Durante o dia você os encontra dormindo em tudo que é canto. Às vezes estão na calçada de uma das avenidas mais movimentadas, onde passam milhões de pessoas gritando e carros buzinando – não se incomodam. É uma demonstração de preguiça e cansaço incrível. Por volta das 9:00pm eles começam a acordar... Aí é uma zona! Procuram comida, correm atrás de rato, de vaca, brigam entre si e latem muito! Quando chego de moto em casa, tarde da noite sempre sou perseguido...

 

Arquitetura

Não tenho conhecimento técnico nenhum sobre isso e não vou falar sobre a belíssima e exótica arquitetura das construções antigas. Isso é sobre as construções modernas: são todas cheias de buracos e quinas! Eu acho muito feio e nada útil... Os prédios e casas geralmente tem dezenas ou centenas de varandas e adornos geometricamente espaçados – uma poluição visual, uma confusão! E o pior é que tem tanto canto e quina, que só serve pra acumular sujeira, mancha de cuspe e deixar o prédio ainda mais feio com o passar dos anos...

 

Natação

Alguns amigos moram em condomínios com piscina aí vou lá pra nadar um pouco e claro que tem curiosidades também. Primeiro que indiano não sabe nadar: nunca vi 1 que soubesse um dos estilos esportivos. É muito engraçado eles nadando estilo “cachorrinho” ou só espalhando água pra tudo que é canto, sem sair do lugar. Tem até aula de natação, mas o professor é indiano, então... Outra coisa é o traje de banho. Tem lugar que se entra de roupa mesmo, saree e tudo! Ou então usam uns maiôs igual o da vovó e o mais engraçado: a toquinha de cabelo! Gente, adultos usam toquinhas coloridas e com babados, de fazer qualquer criança com mais de 6 anos chorar de vergonha!



Buzinês


Clipe: meios de transporte

Familia feliz

Recém-nascido


Video com o hino, antes do filme

Trabalho pesado

Sempre coloridas


Nossa Senhora - Enrolada no Saree


Crianças pedindo caneta

Hijra descascando a banana...

Grupo de hijra dançando na rua.


Contando dedos (atenção pro gesto da menina)

Preguiiiiça

Nada tira o sono.


Haja quina!

Haja buraco!

Frota

De saree no mar

Imagina vestir isso no Brasil?

Saturday, September 13, 2008

Pondicherry: o mundo foi pra la

Já estava sentindo saudade de participar das atividades da AIESEC, já que aqui na Índia eles nunca entraram em contato comigo. Foi quando um amigo do Egito que mora por aqui, Ahmed, me disse que uma haveria uma conferencia nacional dentro de 1 mês. Recomendou que escrevesse para um email, dizendo do meu interesse de participar.

O email veio com uma resposta: Parabéns, você foi selecionado para ser facilitador da June National Conference!! Eu nem sabia que havia me candidatado a isso, mas porque não? Já queria ir à conferencia, agora teria todas as despesas pagas!

Eis que na lista estava também Michelle de Ré! Conheci a Michelle em 2003, numa conferencia no Brasil – nunca mativemos contato, mas foi uma boa surpresa descobrir que ela estava aqui na Índia também, morando em Chennai. Acabamos nos encontrando em Bangalore mesmo, uma semana antes da conferência.

A conferência seria em Pondicherry, cidade litorânea no Estado de Tamil-Nadu e uma antiga colônia francesa. Deveríamos estar no hotel no Domingo, para uma reunião com a organização da conferência. A grande coincidência foi que vários trainees de outras cidades também haviam combinado de viajar para “Pondi”.

Fui para Chennai na sexta-feira Em Chennai percebi o quão bom é o clima de Bangalore – Chennai tem temperaturas de um forno industrial! No trem, quando cheguei próximo da cidade sentia como se derretesse. A cidade toda transpira! As pessoas na rua estão constantemente molhadas e o concreto de uma cidade de 5 milhões de habitantes não ajuda nada. Não vale uma outra visita.

Encontrei a Michelle e pegamos um ônibus para Pondi. Chegamos muito tarde e famintos! O único lugar que achamos para comer foi um hotel chique, na orla. Com certo custo, comemos uma boa massa.

Ficamos numa pousada simples, na parte francesa da cidade. Um charme! Ruas bem limpas, prédios coloridos, cafés e restaurantes bacanas e muitos nomes em Francês. O lado indiano da cidade é igual às outras cidades: caótico, sujo e barulhento. Outra coisa boa é que os impostos não são tão pesados lá, então bebida é beeem mais barato.

No dia seguinte, após um bom café-da-manhã, o plano era encontrar o resto da galera – e que galera! Mudamos de hotel e ficamos próximos a Auro-Ville. Auro Ville é uma comunidade modelo, criada por um guru e sua esposa, segue princípios fundamentais dos mais utópicos comunistas (tudo é de todos) e tenta ser completamente auto-sustentável.

Depois de deixar as bagagens, fui com boa parte do grupo até Paradise Beach. É uma ilha! Pegamos um riquichá até um lugar de onde saem barcos e balsas até a ilha. Já eram umas 3 da tarde e fomos avisados que o último barco voltaria às 5 – pouco tempo pra aproveitar...

Chegamos e encontramos mais uma parte do grupo (era muita gente). Fomos direto pro mar! Meu primeiro mergulho na Baia de Bengal - agora já nadei nos dois mares da Índia. Acho que éramos uns 20 na água, brincando, rindo e pulando as ondas que vinham de todos os lados. Isso era muito estranho, o fundo do mar era todo irregular, com muitos buracos, então as ondas eram malucas, literalmente vinham de todo lado.

Na praia ficavam guardinhas com apitos por todos os lados, controlando a diversão. Tamil-Nadu é um dos estados mais conservadores da Índia. Quando eram 5:30 começaram a apitar desesperados, avisando que o último barco estava saindo. Saímos do mar, e fomos pegar nossas coisas. Mas era tanta gente pra sair da ilha, que claro que levariam vários minutos e barcos para isso.

Aproveitei para tomar uma cerveja. O engraçado é que desde o início haviam placas dizendo que era proibido o consumo de bebida alcoólica. Mas o único quiosque da praia tinha cerveja geladinha, legalize! Fiz questão de tirar foto! Na Índia muita coisa é assim, proibido, mas pode – não faz sentido!

A noite, fomos jantar todos juntos. Na praia, mineiro come peixe! Então pedi o meu peixe ao molho de vinho branco, muito bom! Mas o melhor era parar e dar uma olhada no restaurante. Nossa turma agora tinha umas 45 pessoas! Eram línguas diferentes, aparências completamente distintas e muitas risadas! Contei 34 países diferentes!!! E conseguimos reunir tudo isso sem grande dificuldade, um passando email pro outro e puf! O mundo todo estava em Pondi.

Depois do jantar uma big festa frustrada – já que o grupo se dividiu (difícil manter um grupo tão grande e diverso), mas acabamos numa roda de amigos gostosa regada a cerveja e tequila. Depois voltei à pousada, onde a maioria do pessoal estava sentado na praia à luz de velas na areia – plano era fazer uma fogueira, mas faltou iniciativa... Rs.

No Domingo, eu e Michelle deixamos o grupo e voltamos a Pondicherry (no centro indiano). A reunião estava marcada para as 10am, mas como na Índia tudo atrasa, soubemos que só iria começar às 2pm. Encontramos os outros facilitadores estrangeiros, Arnold do Quênia, Adeel e Hummayun do Paquistão.

Fomos caminhar na praia e encontrei de novo alguns dos outros trainees. Em Tamil-Nadu, não se pode demonstrar afeto em público. Andar de mãos dadas já é algo que perambula no limite do certo e do errado. Distraído, abracei uma amiga – no mesmo instante escutei gritos de um senhor que sentava do outro lado da rua e os apitos de um policial que estava próximo. Não pode!

A cidade estava vazia e caminhar pelas ruas era agradável, apesar do calor. Caminhamos pela praia de Gandhi, onde tem uma grande estátua do herói, pelos parques e fomos até um templo de Ganesh, onde uma graciosa elefanta abençoa os fiéis. Mostrei uma moeda, ela veio com a tromba, pegou a moeda e depois bateu levemente com a tromba na minha cabeça, estava abençoado!

A conferência começou na segunda-feira pela manhã. Como alguns comitês locais não haviam chegado, a abertura oficial foi durante a noite. A AIESEC na Índia é bem diferente (como todo o resto). Seus membros são bem mais novos, muitos indianos começam faculdade cedo – com 16, 17 anos! Então era uma garotada, com muita energia e pouquíssima disciplina.

Os comitês locais não se misturam, sentam todos juntos. Cada um tem vários “gritos de guerra” e como se fossem torcidas rivais num clássico, ficam gritando uns para os outros. DURANTE 3 HORAS INITERRUPTAS!!! Ficam todos molhados de suor, roucos, esganiçados. Tudo atrasa, MUITO! Pra vocês terem idéia, algumas sessões começavam de madrugada!

Bom, não vou detalhar muito aqui pois muitos de vocês não vão entender, mas quem for da AIESEC e quiser saber mais de quão estranha é a conferencia na Índia, eu conto depois. A conferência acabou e no dia seguinte voltei para Chennai para pegar meu trem de volta a Bangalore. Perdi o trem por 5 minutos! Vi ele saindo da estação... Lá estava eu, numa cidade que não conhecia, sem celular (acabou a bateria) e sem passagem de volta pra casa.

Sorte que tinha o telefone de um amigo e após algumas ligações vi que o melhor era ir para a rodoviária e rezar para ter vaga em algum ônibus. Finalmente consegui um ônibus comum, sem ar-condicionado, viagem péssima – mas cheguei são e salvo em casa. Difícil foi segurar o sono no trabalho...

Estação de Trem - Chennai
Pondicherry - Tamil, Inglês e Francês

Caminhando na ex-colonia francesa

Café-da-manhã

Cheguei no paraíso! Cadê o moço de barba?

Mar mais esburacado que já entrei...

Outro lado da ilha

Todo o Mundo!

"É proibido alcool após este ponto"

Pegando o barquinho de volta...

Jantar Global - 30 e tantos países

e tem mais...
1 bençao, sem traumatismo - por favor.

Praia de Gandhi - Pondicherry

Ó o cara aí!

Brasil e Paquistão - Conferência

A gritaria...