O Buzinês
Agora estou dirigindo na Índia. Sim, comprei uma scooter e estou me aventurando no transito. Faço parte da massa que entope os becos, ruas, avenidas e “trilhas de rally” (porque pra ter mais buraco, terra e barro só no Paris-Dakar) que cortam Bangalore, e começo a entender um novo idioma: a buzina. É como se os carros estivessem conversando: uma ultrapassagem tem 3 buzinas: “Abre espaço. To passando. Já vi, pode ir.” Num cruzamento sempre tem discussão e quando não tem entendimento ficam todos parados, um de frente para o outro sem ter como sair.
Caminhões
Os caminhões são um show a parte nas estradas. Sempre ultra-coloridos, pintados, com adesivos e cheios de coisas penduradas: chumaço de cabelo, flores secas, flores frescas, brinquedos, panos coloridos, estatuetas de deuses, foto da família, etc. Na traseira, sempre escrito “Horn OK Please” – buzine por favor. (já expliquei isso aqui). Outra característica é que são muito quadradões, alguns literalmente são containers (como aqueles dos portos) com rodas. A grande maioria está caindo aos pedaços e não é difícil vê-los com muito mais carga que deviam. Nunca vi um caminhão-pipa que não estivesse vazando água pela rua afora – agora imagina um caminhão-tanque, carregando combustível?
Carro de Família
Continuando no trânsito, outra curiosidade... Na Índia, moto é veículo de família! É muito comum ver um pai carregando os 5 filhos empilhados numa moto, mulheres carregando recém-nascidos na garupa ou criancinhas que não devem nem andar ainda, se segurando no guidom da moto. Detalhe importante, o capacete só é obrigatório para o motorista...
Refeições barulhentas
Lembro o quanto meus pais (meu pai principalmente) me educaram a não comer de boca aberta e tentar não fazer ruídos ao mastigar. Aqui na Índia eles teriam um troço. A impressão que dá é que comer de boca aberta, estalando a língua, chupando os dedos e fungando o nariz (por causa da pimenta) é sinal de que está gostando da comida. Tem um cara que trabalha perto de mim e cisma de comer em frente ao computador, ao invés de ir pro refeitório – tenho q colocar fones de ouvido e música alta para concentrar no trabalho.
Cinema
Depois de muuuito tempo fui ao cinema. A primeira barreira é conseguir o ingresso. Aquilo de ligar pra um amigo, 1 hora antes, combinar de pegar um cineminha, chegar 20 minutos antes da sessão (que é pra dar tempo de dar uma volta no shopping) e ver o filme é coisa do meu passado. Aqui tem que comprar com antecedência de dias, se for lançamento é melhor nem ir durante o fim de semana. Os cinemas dos shoppings são modernos, muito confortáveis e de ótima qualidade de som e imagem. As bizarrices são: primeiro toca o hino nacional. As pessoas chegam a qualquer momento – mesmo com 40 minutos de filme ainda tem gente chegando. TEM INTERVALO!! Não importa o tamanho do filme, tem um intervalo, sem aviso prévio. Abruptamente o filme é cortado, as luzes se acendem e o pessoal sai pra comprar tudo que é fritura – o pior é que não avisam quando o filme irá recomeçar... Perdi uma parte de Dark Knight porque não sabia que já tinha começado (pô, nem uma campanhiazinha??)
Santos Católicos, adoração Hindu
A comunidade católica em Bangalore é bem grande, se comparada às outras cidades que fui. Tem muita igreja, altar pra santinho... O curioso é que apesar dos santos terem os mesmos nomes (só que em Inglês) e a mesma imagem, a maneira de adoração é diferente - mais voltada pro Hinduísmo. Às vezes colocam comida (que seria o Pooja), sempre colocam aqueles colares de flores (dente-de-leão), marcam a face do santo com aquela maquiagem vermelha, vestem Nossa Senhora de saree, etc. Como diria Gil (leia com sotaque baiano), “é o sincrétismo culto-réligioso em sua expressão típica do súb-continênte asiático.”
É briga?
Além das buzinas incessantes, outro barulho constante é das vozes dos indianos. Não bastassem falaram super rápido em 23 diferentes dialetos incompreensíveis, falam com uma tonalidade que parecem estar brigando com um inimigo mortal a todo o momento. No início eu ficava sempre observando, esperando sair um tapa – depois descobria que era só uma discussão sobre algum pequeno detalhe. Será que volto meio surdo pro Brasil?
Construção, Mulheres e Ferramentas sem cabo.
Um engenheiro civil deve ficar muito chocado na Índia. É muito bizarro a maneira que eles constroem as coisas por aqui. Não dá pra explicar muito, mas vou enumerando as bizarrices: os tijolos são, em sua maioria, de pedra (furar uma parede na Índia é tarefa pra broca industrial – pra pendurar quadros tem que se fazer um enxerto de madeira na parede, não tem prego que fure.
Tem muitas mulheres trabalhando. Mas não se preocupem, elas só fazem o trabalho pesado: preparar massa, carregar pedra, carregar água, areia... O trabalho “pensante” só homem que faz. – como explicou um mestre-de-obras a um amigo engenheiro. Elas carregam tudo na cabeça, e feito formigas vão andando em filas dentro da construção.
As ferramentas tem todas cabos muito curtos. Isso é geral! Vassoura, pá, enxada, rodo, picareta... tudo tem um cabo minúsculo que dificulta muuito o trabalho (na minha opinião). E o trabalho é praticamente artesanal, somente construções muuito grandes têm maquinas trabalhando...
Supermercado
Pra ir no supermecado fazer a compra da semana (ou do mês) tem que rezar pra ter sorte antes. Não existe padrão! Aquela marca de macarrão que você comprou semana passada, não tem mais e talvez nunca mais tenha. Eu comi granola por 2 meses, depois nunca mais achei. Tem semana que tem da batata grande, outra só da pequenininha, tem semana que tem feijão, outras não... E tem lugar ainda que você tem que passar por diversos caixas para pagar: 1 só para pagar frutas, outro para as carnes, outro para as bebidas... A conta ainda vem dividida no que é comida e no que é não-comida.
Crime
Algumas pessoas me perguntam sobre violência aqui. É muito raro ter assalto nas ruas, ladrão de carteiras, etc. O lado ruim é que tem extremismo religioso, ataque terrorista, mulheres são estupradas, tem vandalismo até por rivalidade de línguas!!! Lembro de um cinema que foi apedrejado só porque estava estreando um filme em Tamil (língua falada no estado vizinho de Karnataka). Imagina se a gente resolve explodir a Globo por causa do carioquês?
Caneta
Isso é uma coisa que se encontra em pequenas cidades; triste, mas interessante... Crianças pedindo lápis e caneta. Me disseram que há um tempo, elas ficavam mendigando por comida e dinheiro – mas aí teve uma campanha enorme para que fossem dadas canetas às crianças, para ir à escola. Acabou virando tradição então você vê crianças pedindo caneta, com livrinhos nas mãos ao invés de dinheiro.
Hijras e Prostitutas
Há um grupo de transexuais muito respeitado aqui – acredite se quiser. São considerados semi-divinos, têm os genitais amputados quando criança, vestem saree (a veste tradicional da mulher indiana) e saem pelas ruas abençoando os homens em troca de moedas. Quem dá moeda é abençoado (na cabeça lá de baixo) e tem fertilidade, quem não dá pode ser amaldiçoado (também relativo à cabeça de baixo...).
Contando Dedos
Os gestos dos indianos são todos muito diferentes a começar pelo jeito que dizem “sim” com a cabeça (que eu agora faço naturalmente). Um muito curioso talvez seja como contar com os dedos. Eles contam com as falanges, então cada dedo vai até 3 e em cada mão dá pra contar até 12 – pois o polegar é utilizado somente para apontar o valor. Talvez esteja aí a origem da “dúzia”.
Cachorrada
Além de vacas, ratos e esquilos, as ruas têm muitos cachorros – muitos! Durante o dia você os encontra dormindo em tudo que é canto. Às vezes estão na calçada de uma das avenidas mais movimentadas, onde passam milhões de pessoas gritando e carros buzinando – não se incomodam. É uma demonstração de preguiça e cansaço incrível. Por volta das 9:00pm eles começam a acordar... Aí é uma zona! Procuram comida, correm atrás de rato, de vaca, brigam entre si e latem muito! Quando chego de moto em casa, tarde da noite sempre sou perseguido...
Arquitetura
Não tenho conhecimento técnico nenhum sobre isso e não vou falar sobre a belíssima e exótica arquitetura das construções antigas. Isso é sobre as construções modernas: são todas cheias de buracos e quinas! Eu acho muito feio e nada útil... Os prédios e casas geralmente tem dezenas ou centenas de varandas e adornos geometricamente espaçados – uma poluição visual, uma confusão! E o pior é que tem tanto canto e quina, que só serve pra acumular sujeira, mancha de cuspe e deixar o prédio ainda mais feio com o passar dos anos...
Natação
Alguns amigos moram em condomínios com piscina aí vou lá pra nadar um pouco e claro que tem curiosidades também. Primeiro que indiano não sabe nadar: nunca vi 1 que soubesse um dos estilos esportivos. É muito engraçado eles nadando estilo “cachorrinho” ou só espalhando água pra tudo que é canto, sem sair do lugar. Tem até aula de natação, mas o professor é indiano, então... Outra coisa é o traje de banho. Tem lugar que se entra de roupa mesmo, saree e tudo! Ou então usam uns maiôs igual o da vovó e o mais engraçado: a toquinha de cabelo! Gente, adultos usam toquinhas coloridas e com babados, de fazer qualquer criança com mais de 6 anos chorar de vergonha!