Tuesday, August 12, 2008

Goa: Pallolem Beach

Antes de vir pra Índia já escutava este nome: Goa. Passagem obrigatória dos turistas, o lugar de onde surgiu o trance, praias belíssimas, uma antiga colônia portuguesa, onde havia alguns (poucos) resquícios da nossa da língua Portuguesa.

Aproveitando um feriado na terça-feira, partimos para 4 dias na praia. Éramos alguns trainees que moravam em Bangalore, outros de Mumbai e outros de Chennai. Ao todo: uns 16. Dentre estes, a Juli!!! A Juli é uma amiga colombiana, trabalhamos e dividimos uma casa (ou flat??) durante 1 ano em SP. Coincidência boa estarmos os dois na Índia agora.

Decidimos ir a Pallolem Beach, no Sul de Goa. Parecia que estávamos todos na mesma situação: stressados com o trabalho ou com a cidade que estávamos vivendo. O plano era re-la-xar. Nada de passeios longos, ônibus, visita a templos... “Só” praia, sol, mar, cerveja, comida bom e risadas.

Nós de Bangalore fomos de ônibus fretado e depois de virar a noite na estrada, acordamos em Goa. Caminhando para a praia, eu ainda tinha o incômodo de carregar uma mala maior, terno e laptop – de Goa iria para Delhi a trabalho. Tive explicar várias vezes: “porque você trouxe terno pra praia???”

Palolem Beach é uma vila pequena, colorida e graciosa. Claro que tem a rua do comércio (como as praias brasileiras), cheia de lojinhas de artesanato e outros souvenires. A praia é bonita: uma baia com rochas nas pontas, mar azul e areia fina. Ao fundo, entre castanheiras e coqueiros, as pousadas, sempre com o restaurante voltado ao mar e decorado com lanternas, colchões e almofadas coloridas – uns mais chiques e outros mais simples.

Após andar um bocado, acabamos encontrando uma pousada de bom preço e capaz de acomodar o grupo quase todo – alguns casais preferiram outra pousada. Chegando na pousada, não se passaram 5 minutos, já estava de bermudão, olhando as ondas e tomando uma cerveja gelada – mesmo depois de uma noite mal dormida da viagem.

Depois veio o café da manhã reforçado, mais uma cerveja e finalmente o primeiro mergulho no Mar Arábico, Oceano Índico. E foi exatamente isso que pensei quando me joguei no mar, boiando com a cara pro Sol: “meu Deus olha onde eu to! Nadando no Índico”!

O pessoal de Mumbai e Chennai chegou. Corri na praia pra dar um abraço na Juli e logo fui conhecendo todo mundo. Almoço na praia: camarão e peixe, é claro (como todo bom mineiro)! Praia também pede FUTEBOL! O jogo foi: América do Sul (Brasil e Colômbia) x África (África do Sul, Camarões e Egito). América do Sul na cabeça!

O Sol começou a baixar e fui caminhar na praia com a Juli – muito tempo sem conversar direito, muita coisa pra compartilhar sobre a loucura de se viver na Índia, planos para o futuro, coisas da cabeça e do coração.

Fomos ver o pôr-do-sol no lado esquerdo da praia, onde tem um resort de cabaninhas de madeira. Depois de subir nas pedras, uma cena estranha... Uma equipe de filmagem, gravando 2 mulheres loiras nas pedras, em poses sensuais enquanto um homem com cara de malandro as entrevistava. Disse pra Juli: “Putz, parece até filmagem de filme pornô”.

Queríamos tirar foto ao por-do-Sol, fui pedir um grupo de meninas que estavam do lado. A primeira coisa que uma delas me disse foi: “Você não acha que aquilo parece um filme pornô?”

De noite fomos jantar todos juntos, mesa gigante com papos e risadas diversos. O William levou uma garrafa de cachaça colombiana (além de 23 kilos de doces que trouxe na bagagem de mão, direto da Colômbia) – já tinha tomado antes, dilícia! Depois de comer, pedi um narguilê de maçã pra fumar com o pessoal. Desculpa o mineirês, mas ô trem bom pra relaxar!

Relaxei demais, bateu um sooono de fazer a pressão baixar. Fui sozinho de volta pra pousada, caminhando na praia onde vaquinhas dormiam (sim, tem vaca até na praia), ouvindo o quebrar das ondas sob a luz de um céu estrelado como há muito tempo não via.

Estava tão gostoso caminhar pela praia, sentindo a brisa fresca e salgada, que nem percebi que havia passado da pousada. Cheguei até o outro lado da praia, onde o céu estrelado se refletia num rio que desemboca no mar. Foi o reflexo das estrelas que me salvou de um banho de rio na madrugada.

Acordar na praia, ao som do mar, tomar um banho frio, uma água de côco e correr! Adoro correr, na praia então é compromisso certo – acordo cedo só pra correr na praia. Depois da corrida, café-da-manhã e de novo a rotina: cerveja, mar, mar, mar, cerveja, cerveja, mar, futebol, cerveja, risadas. Nossa pousada deixava pranchas de bodyboarding disponíveis aos hóspedes. Foi a primeira vez que usei essas pranchas, é muito bom!

Ficamos sabendo de uma festa, uma tal de Silent Noise (barulho silencioso). O esquema era: festa na areia, 2 DJs tocando trance, entrada free e música rolando até as 23:00. Depois deste horário, música só pra quem alugasse fones de ouvido sem fio. Estávamos cépticos sobre a festa, não alugamos os fones de ouvido. As onze anunciaram: a partir de agora, música só nos fones.

Foi incrível estar em um silêncio absoluto e ver centenas de pessoas com fones se remexendo na areia, sorrindo e dançando muito. Corri pra comprar o meu! Adorei a festa, ainda mais porque dava pra conhecer muita gente. Bastava pedir para tirar o fone e conversar normalmente, sem gritaria, sem mímica – fazia silêncio.

Voltei pra pousada às 5 e alguma coisa e tinha um compromisso logo mais. Tínhamos alugado um barco para ir ver golfinhos naquela manhã. Segundo os nativos, só seria possível logo de manhazinha, tipo às 7.

Não é bom pegar um barco mar adentro, de ressaca, sem dormir. Mas isso não foi o pior... Golfinhos??? Vimos de longe uns 3, só as costas enquanto fugiam dos barcos. Sabe aquelas cenas de filmes, com os golfinhos pulando perto do barco – pois é, não foi assim.

Uma das coisas mais legais da viagem foi ver o Sol se pôr no mar. No Brasil eu sempre via ele nascendo do mar e se pondo no continente... Mas eu tava do outro lado! Lindo, lindo ver aquela bola laranjada gigante se fundindo com o mar. Só faltou fazer Tsssssss.

Além de um lugar delicioso, a companhia era muito boa. Muito bom dar gargalhadas a todo o momento, ter conversas aleatórias e se divertir com gente do mundo todo... Além disso, se divertir com coisas novas como brincar de “catch” (uma das coisas que se faz no cricket) com o sul-africano e fazer acrobacias na areia.

Depois de 4 dias na praia, fui para Delhi relaxado, pronto pra agüentar uma série de reuniões, poluição, calor insuportável – o pacote completo. Goa pede outra visita. Lá, descobrir o melhor remédio para a vida caótica e irritante das metrópoles indianas – viajar!

Se vier a Índia a trabalho, faça questão de ter direito de tirar dias de folga, esticar feriados, de não trabalhar todos os Sábados... É mesmo uma necessidade. Teria Amyr Klink escrito o famoso: “...um homem precisa viajar...” depois de uma temporada na Índia?

Só posso concordar com ele.



Cafe da Manhã

Vista ao chegar...

Nossa pousada.

Fim de tarde.

A trupe.



Brasileños.

Pôr-do-Sol.

Eu, brincando de Apollo.

Cachaça da Colômbia, amiga da Romênia.

Jantarzinho...


Vista noturna.

Dançando sem música.

Agora com música.

Aqui nasceu as raves.

Caça golfinho.

Golfinho, só sonhando...

Vaquinhas na praia, claro.

Relax.

...

O vento tava atrapalhando...

Monday, August 11, 2008

Parênteses: Reparação em Tempo

Abro mais um parêntese. Desta vez para compartilhar com vocês um texto enviado por um amigo que fiz durante meu tempo em São Paulo. De um humor afiado, um alto-astral invejável e inteligência admirável, o Rodolpho vez em quando me dá a felicidade de ler seus textos por e-mail (essa é pra explodir seu “pequeno” ego, hein Rodolpho?). Este é sobre o tempo...

Reparação em Tempo
Rodolpho Rocha (1)

Nunca se escreveu tanto, nunca se produziu tantas elucubrações sobre o tempo, sua importância, como usá-lo, como se tornar mais feliz dele se apropriando.

O que antes parecia ser preocupação dos poetas, compositores populares e filósofos pré-socráticos, hoje invadiu o erudito mundo dos negócios. Daí essa intensa “manifestação cultural” que, de forma mais oportunista que ingênua, nos apresentam receitas e recomendações para a conquista da felicidade neoliberal.

“Gestão do Tempo”, “Maximização do Tempo”, “Otimização do Tempo”, “Produtividade Pessoal”, são alguns dos títulos de livros ou de workshops que demonstram nossa conversão a esse tão disciplinado e eficiente ramo do conhecimento humano.

Em contraponto a esse ciclo de modernidade, segue o texto abaixo elaborado após entrevista com membro dissidente do movimento. (2)
Tempo você não investe.
Tempo você não resgata.
Tempo você não empresta.
Tempo não se desperdiça.
Tampouco se recupera.
Tempo nunca foi dinheiro,
(pois se o fosse, os Bancos dele se apropriariam e,
generosamente, o venderiam para nós com juros obscenos).
Tempo você não acumula,
porque não se pode ser guardado.
Tempo não passa, não vai, nem fica,
porque não é bloco de Carnaval,
nem catapora, nem propaganda gratuita de TV.
Tempo nunca se esgota,
o que acaba é apenas a areia fina
que um idiota desocupado
despejou num vidro de cintura fina e o chamou de ampulheta,
não sabendo o que fazer com o tamanho do seu tédio e o vazio da sua solidão.
Tempo não pode ser gerido,
porque você não é seu dono.
Tempo não pode ser absorvido,
porque não há estoque de toalha de papel disponível.
Tempo não pode ser curtido,
porque não é picles exibido em gôndola de supermercado.
Tempo não passa lentamente.
Tempo não voa tão depressa,
porque não é passarinho, não come alpiste, nem caga na sua desatenta cabeça globalizada.
Ninguém consome tempo,
nem por ele é consumido,
porque tempo não é alimento, não engorda, não provoca gases nem é distribuído em cestas básicas.
Tempo não cura porra nenhuma!
E nem faz parte do receituário farmacológico nacional (incluindo genéricos).
Tempo não acaba com sua dor de corno,
e nem apaga as cagadas que você cometeu.
Foi você, com sua sabedoria quase desconhecida
que guardou toda essa dor, toda essa ira
no lugar certo, dando-lhe o seu verdadeiro tamanho e significado.
E agora torna esses eventos quase bonitos
posto que é só lembrança.
Mas o tempo não tem nada a ver com isso!
Portanto, se você quer aprender sobre o tempo
fale com os malucos que nunca
acreditaram na divisão passado-presente-futuro que quiseram lhe impingir.
Ou fale com os preguiçosos,
que quase por reverência (ou por inércia)
não explicam o tempo, nem pensam em dominá-lo,
sabiamente, a ele se entregam!

(1) Notas sobre o autor: Rodolpho Rocha é consultor de empresas e vê com muita seriedade as questões relacionadas à administração e uso do tempo. Faz questão de destacar que o texto quase-poema não reflete sua posição pessoal, porque ele não sabe se a tem. A história é fictícia, o personagem é fictício, o congresso também o é. Só é verdadeira a morena e seu sorriso escancarado, assim como a praia deserta no litoral baiano que o brancaleônico exército dos ambientalistas insiste em preservar.
(2) Notas sobre o personagem: O personagem em questão era renomado palestrante de seminários internacionais sobre Administração do Tempo e não raras vezes aparecia em capas de revistas especializadas. Ocorre que num grande evento em São Paulo, onde faria a conferência magna, não apareceu: estava em ótima e sorridente companhia numa praia deserta no litoral baiano. Foi injuriado, foi processado, perdeu muito dinheiro, perdeu todo prestígio conquistado. Mas não se arrependeu nem um pouco da decisão tomada e hoje encanta turistas que compram suas peças de artesanato e ficam deslumbrados com o seu inglês tão fluente.
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(english version)
Brackets: Mending Time
Another bracket. This time is to share with you a text I received from a friend I made while I was in São Paulo. With a sharp humor and admirable intelligence; Rodolpho – one in a while – gives me the happiness of reading his writings on my mail box. This one is about “time”…
Mending Time
Rodolpho Rocha(1)
There has never been so much written, there has never been so many lucubrations about time, its importance, how to use it, how to be happier by appropriating it.

What used to only concern poets, popular music composer and pre-Socratics philosophers, today it has invaded the erudite world of business. That’s where the intense “cultural” manifestation, that in a more opportunistic than naïve way, shows us recipes and recommendations to achieve neo-liberal happiness.

“Time management,” “Maximization of Time,” “Optimization of Time,” “Personal Productivity,” are some of the book titles or workshop names that demonstrate our conversion to this so disciplined and efficient subject.

On the other side of the movement, the text below was created by a dissident of this successful universal movement. (2)
Time can’t be invested.
Time can’t be rescued.
Time can’t be lent.
Time can’t be wasted.
You also can’t get time back.
Time has never been money,
(because if it were, the banks would claim ownership over it and generously sell it back to us with obscene interest rates).
Time can’t be accumulated,
because you can’t keep time.
Time doesn’t pass, doesn’t go, doesn’t come,
because it’s not a parade float,
nor is it chicken pox, or an infomercial on TV.
Time never runs out,
what ends is just the fine sand
that some idiot with nothing to do
put in a glass with a tiny waistline and called it an hourglass,
not knowing what to do with his immense boredom and the empty space of loneliness.
Time can’t be managed,
because you’re not its owner.
Time can’t be absorbed,
because there aren’t enough paper towels.
Time can’t be cured,
because it’s not pickles on display in a supermarket aisle.
Time doesn’t go by slowly.
Time doesn’t fly so quickly,
because it’s not a birdie, it doesn’t eat bird seed, and it doesn’t poop in your distracted global head.
Nobody consumes time,
or is consumed by it,
because it’s not food, it doesn’t make you fat, it doesn’t give you gas, nor is it bought with food stamps.
Time doesn’t heal a goddamn thing!
And it doesn’t even exist in pharmacies anywhere (not even a generic substitution).
Time doesn’t heal the pain you feel when you’re cheated on,
And it doesn’t erase your fuck-ups.
It was you, with all your almost unknown wisdom
who kept all this pain, all this anger
in a great place, giving it its proper size and meaning.
And now you make these events almost beautiful
even though they’re only memories.
But time has nothing to do with it!
So, if you want to learn about time
Talk to the crazy people that never
believed in the division of past present future that others wanted to impose on people.
Or talk to the lazy ones,
those who, almost as an act of reverence (or due to inertia)
don’t explain time, nor do they think about dominating it,
full of wisdom, they give themselves to it.

(1) Note about the author: Rodolpho Rocha é HR consultant and takes time management issues very seriously. He wants to emphasize that the text, which is almost a poem, does not reflect his personal opinion, because he’s not sure he has one. The story is fictitious, the character and the big event are also. The only real part is the tanned beauty and his enormous smile, and also the deserted beach in the north of Brazil that a pasty white army insists on saving.
(2) Note about the character: The fictitious character used to be a famous lecturer in international workshops about Time Management, and many times has he appeared in magazine covers. But during a big event in São Paulo, where he was supposed to give an important lecture, he didn’t show up: he was all smiles and in great company on a beach in the north of Brazil. He was insulted and sued. He lost all of his money and all of his prestige. But he didn’t regret his decision at all. Today he charms tourists who buy his handmade pieces of art and are surprised to hear his fluent English.