Wednesday, October 22, 2008

Coorg - Arrepios e "Coincidências"

Durante a conferência da AIESEC em Pondicherry, além de muitas outras pessoas conheci a Raquel, uma Portuguesa, filha de pai africano (Cabo Verde) e mãe Brasileira. Pode-se dizer que a mistura deu muito certo... Mas to falando dessa tuga, porque ela foi o ponto de partida pra uma viagem inesquecível. 

Depois da conferência, a Ra quis apresentar os trainees que ela havia conhecido para suas colegas de casa. Organizamos um jantar num restaurantezinho em Frazier Town, norte de Bangalore. Risadas, boa comida, bate-papo... e de repente a Rumela (que mora com a Ra) diz: “Ah estamos indo pra Coorg neste fim de semana”. – sem nem pensar se estava sendo inconveniente, disse: EU QUERO IR!! 

Reagi assim, porque a Mari (de Santos) estava louca pra fazer sua primeira viagem na Índia, tinha conseguido liberação no trabalho, mas de última hora teve sua viagem cancelada. Então acrescentei: E tem uma amiga que com certeza vai querer ir junto! Rumela foi sincera e disse que não havia problema nenhum irmos, mas seria quase impossível achar passagens...

No dia seguinte, falei com a Mari e é claro que ela animou. Coorg é uma região serrana conhecida pela vida selvagem e pelas suas belíssimas matas e rios de corredeira. Ficar no meio do mato, respirar ar puro e caminhar pelo verde – era tudo que queríamos... Fui comprar a passagem, rezando para que ainda tivesse, qualquer uma, so queria chegar lá.

Consegui as passagens, não tinha mais lugares juntos, mas isso seria pedir demais. Confirmei com a Ra e com a Rumela que estávamos indo... A Rumela havia dito que pegariam o ônibus na estação Majestic, no meu bilhete estava escrito estação Kempegowda, então nos encontraríamos em Coorg pela manhã.

Mas chegada a hora de embarcar, quando entramos no ônibus... Por coincidência havia comprado passagens exatamente no mesmo ônibus e os assentos eram todos próximos! Majestic e Kempegowda é a mesma coisa, como se um fosse o nome oficial e o outro um apelido carinhoso... Estava formado o grupo da viagem de Coorg: eu, Ra, Rumela, Mari, Camila e Deepak.

Cansado por causa da stressante semana no trabalho, dormi quase a viagem toda, ou pelo menos tentei. Chegamos de madrugada e o Bopu nos buscou de jipe. Bopu é primo do Deepak e guia turístico por lá. Ele nos levou a um lugar provisório, para esperarmos o amanhecer e então seguir para nossa pousada.

Ficamos num quartinho escuro e úmido, cochilamos como foi possível e somente ao acordar pudemos perceber onde estávamos. Era uma casa grande, no meio da serra. Neblina e cheirinho de mato molhado... A dona da casa, uma senhora cheia de energia e bom humor, que abriu um sorriso largo quando soube que eu e a Mari éramos brasileiros – ela havia passado umas férias no Nordeste.

Embarcamos no jipe novamente, agora rumo à pousada. Sobe serra, desce serra, e entra em buraco, enquanto nossas pernas se entrelaçavam na traseira do jipe, tantando aproveitar todo o espaço possível.

O jipe não chega até a pousada, tem que parar antes e então temos que caminhar. Descemos um morro íngreme, atravessamos uma plantação de arroz, pulamos uma cerca, atravessamos uma ponte de bambu sobre um riacho e chegamos. Que maravilha! No meio do NADA uma casinha charmosa, de cimento, madeira e grandes janelas de vidro – para aproveitar a vista para a imensidão do verde de Coorg. Quartos espaçosos, e uma área comum com colchões e almofadas no segundo andar, perfeito!

Demos uma refrescada, trocamos de roupa e embarcamos no jipe para começar as aventuras... O plano era fazer um Rafting! Sobe serra, desce serra e uma paisagem mais maravilhosa que a outra – e verde, muito verde! As plantações de café e de chá dão diferentes tonalidades e contrastam com os coqueirais e a mata fechada.

Chegando no lugar do Rafting soubemos que teríamos que esperar. Sem problema, um senhor (que eu esqueci o nome) dono do lugar nos acompanhou por uma caminhada em meio às plantações de café. Com fome, almoçamos num lugar muito, muito simples à beira do rio. Comer com as mãos e super apimentado!

Ao voltar, esperamos mais um pouquinho e chegou a hora! Os instrutores nepalenses nos separaram em 2 botes. Recebemos as instruções e simulamos o trabalho da equipe em terra, depois na água. Tínhamos que obedecer a comandos específicos em determinados momentos: forward team, over right, over left, get down!

O rafting foi muito bom! Bem emocionante, mas poderia ser mais... O rio deveria estar mais cheio por causa da monçoes, mas a chura não veio como prevista. Mesmo assim foram muito divertidas as quedas d’agua que passamos.

Depois do rafting, passamos na cidade pra comprar bebidas pra festinha. Na volta da pousada a travessia foi durante a noite – iluminada só com a luz da lua e dos celulares. Milhares de sapos disputando a cantoria com grilos e acompanhados por vaga-lumes. Em casa, jantar a luz de velas e depois aula de dança: forro, salsa e zouk. A Ra era professora dança em Portugal desde a adolescencia, então nos deu aula de Salsa e Zouk. Gostei de aprender e dançamos muito! 

Dormimos e ainda lembro da sensação gostosa de acordar, olhar pela janela e vislumbrar o verde! Acordei antes do pessoal, meditei um pouco e me espreguicei na rede... Tomamos café-da-manhã e embarcamos novamente no Jipe. Dessa vez, o plano era visitar uma comunidade budista e se desse tempo, um parque de elefantes selvagens. 

Poucas horas depois, chegamos na comunidade budista de Kushalnagar - mais especificamente no Templo Dourado. Circundado por um imenso monastério, o templo é simplesmente de tirar o fôlego. Gramados muito bem cuidados, cores belíssimas e muito ouro nos ornamentos. Tudo majestoso e muito, muito grandioso. A gente não sabia, mas aquela era a 2ª maior comunidade budista fora do Tibet. A Mari estava já levitando, ela praticava budismo no Brasil. 

Entramos em diferentes partes do templo e presenciamos rituais com alguns monges. Passeamos pelos parques e eu até brinquei de futebol com crianças monges. Era o horário do almoço e por coincidência o Bopu tinha um conhecido tibetano, que morava por ali. O Loden é um refugiado e nos encontrou com sua linda filhinha. Almoçamos num restaurante de comida tibetana e ouvimos histórias absurdas sobre a repressão chinesa no Tibet, as relações políticas dentro do budismo, conspirações contra o Dalai Lama... 

No meio do papo ele nos perguntou: vocês já foram no grande templo? Achei que ele se referia ao templo dourado.. Pra nossa surpresa, não. Ele nos levou até a SeraMei, uma faculdade budista. Mais simples, sem todo o ouro, sem os ornamentos, mas muito grande. Nos muros, fotos horríveis de corpos de monges que foram torturados pelo exército Chinês. Infelizmente os números e as atrocidades que estão acontecendo por lá não chegam aos nossos olhos, a mídia não tem voz… 

Estava tudo vazio no grande pátio e havia um templo enorme no meio. Nas escadarias, milhares de calçados e quanto mais nos aproximávamos, mais intenso ficava o murmurinho de mantras. Quando chegamos perto, o arrepio foi inevitável. Pelas janelas vimos cerca de 2000 monges, sentadinhos em fileiras e entoando mantras que quase faziam as janelas tremerem (acho que eu tremi). Era um mar amarelo e vermelho, que ondulava para trás e para frente, numa dança que espalhava bondade para o mundo todo. 

Nosso amigo tibetano fez questão que entrássemos. Andamos pelos monges enquanto repartiam pão e rezavam, como rezavam – a um só som. Subimos no “altar” e visão era ainda mais arrepiante. Lá, ornamentos feitos de açucar e um trono, onde o Dalai Lama já esteve. 

Ao nos ver completamente encantados com aquela cerimônia, ele nos explicou: vocês deram sorte, isso não acontece normalmente, mas por coincidência, hoje é aniversário do Dalai Lama e eles estão comemorando! Sem palavras... 

De lá, visitamos a faculdade e a residência oficial do Dalai Lama, pena que estava fechado e não dava pra visitar. Praticamente todos os monges estavam no templo... Não precisou. Já estávamos em estado de graça e ficamos por um tempo sentados, observando uma grande plantação de chá e pensando naquelas coincidências. 

Era hora de nos despedir, pegamos o jipe e voltamos para a pousada. No caminho, paramos no que deveria ser uma cachoeira na beira da estrada. Triste e revoltado, Bopu nos disse como o aquecimento global tem interferido em tudo, a cachoeira era só um filete descendo pela rocha. A vista era incrível. 

Jantamos num hotelzinho simples e pegamos o ônibus de volta a vidinha estressante de Bangalore. Mas estávamos vacinados. Ah! E é claro que coincidentemente, estávamos todos no mesmo ônibus novamente. 

Uma viagem que eu só soube na véspera se tornou uma das melhores experiências e me trouxe uns dos melhores amigos. Já faz algum tempo que não acredito em coincidências... Alguém ainda acredita?

Paisagem de Coorg - Plantação de chá

Pernas no jipe

Em direção à casa


Atravessando o arrozal

Varanda onde tomamos café

Verde ao infinito

Salinha aconchegante

Vidão

Rio das WhiteWaters

Caminhada

A trupe: Camila (Suécia), Mari (Santos), eu, Ra (Portugal), Deepak e Rumela (Índia)

Get down Team!

Depois do rafting

Delicioso jantar

Zouk

Golden Temple

Monumental

Ornamentos

Oração

Grande Templo

Entrada do Templo

...

Paredes pintadas - as cores são incríveis

Mini-monges

Monge jogando cricket

Restaurante tibetano

Imagens de tortura - triste e revoltante

Trupe + Loden e a pequena Mela

Calçados na escadaria

Eu e Ra

Arrepios

Casa Dalai Lama

Coincidência??